quinta-feira, 29 de julho de 2010

Vida de estagiário, parte final




O ambiente em si era bastante organizado e tinha uma aparência limpa. Os equipamentos eram novos e os funcionários pareciam bem treinados. Virei-me e vi, do outro lado do salão, uma enorme silhueta contra a luz que entrava pela janela da parede oposta. Devia ter mais de dois metros de altura, ombros largos e braços musculosos. Algumas tatuagens, talvez símbolos de lealdade a alguma gangue, eram visíveis na pele esticada sobre os músculos protuberantes. Estava de costas e parecia concentrado na tarefa de destrinchar uma carcaça de origem dúbia e para isso se utilizava de um enorme cutelo, manchado de sangue e coberto de restos de entranhas.
- Aquele ali é o nosso chef. – informou, eficiente, o gerente.
- Hmm. Grandinho ele, né?
- O senhor vai querer falar com ele agora?
- Hmm, não. Não, acho que ele tá bem ocupado, não quero atrapalhar o serviço dele... – hesitei, enquanto observava os pedaços de vísceras voando a cada golpe do enorme cozinheiro.
- Besteira. Ele não se importa. Fifi? O moço quer falar com você.
- Oi? Fifi?
A figura gigantesca se voltou para mim. Era um homem de físico avantajado, cabelos compridos tingidos de loiro, maquiagem e o maior par de seios que eu já visto fora de uma revista pornô. Me olhou de cima a baixo com uma expressão de agrado e eu me senti grato pela longa bata da Vigilância Sanitária que eu estava vestindo por cima das minhas roupas. Ao terminar a avaliação, sorriu maliciosamente.
- Bom dia, moço.
- Bom dia, seu...quer dizer, dona...ahn...bom dia, Fifi.
Não conseguia tirar os olhos dos seios de Fifi. Aquele peitos incongruentes, estufados debaixo do avental manchado de sangue, eram tão desconcertantes que me deixaram sem fala por alguns momentos.
- Gostou, moço? – perguntou o cozinheiro, me encarando nos olhos.
- Oi? Se eu gostei? Gostei de quê?! – retorqui, na defensiva.
- Da minha cozinha, moço... – respondeu Fifi, candidamente.
- Ah, sim. Muito boa. É uma cozinha de respeito. Quer dizer, é muito...muito limpinha ela. Organizada. Parabéns, viu?
- Ai, brigada, moço.
- Agora tem um probleminha, Fifi.
- Qual? – perguntou Fifi, arregalando os olhos delineados com lápis muito escuro.
- Hmm. É a sua...a sua maquiagem. Não pode, Fifi. Dentro de uma cozinha não pode bijuteria, perfume e nem maquiagem. Hmm. Sinto muito.
- Mas moço! E eu vou sair na rua sem me pintar? Sem um brinquinho? É o mesmo que sair pelada!
Estremeci quando imagens do cozinheiro Fifi, vestindo apenas um Toc Blanc na cabeça e carregando um cutelo manchado em uma das mãos, invadiram a minha mente, que quase entrou em colapso naquele momento.
- Heim, moço? Como é que eu faço?
- Oi? Desculpa, Fifi, me distraí. Olha, eu sei que é chato, mas cozinha não é lugar de...de ficar bonita. Você bota suas jóias e maquiagem quando largar, pode ser?
- Sei disso não, moço. Não garanto nada. – respondeu Fifi, cruzando os braços sobre o peito volumoso e ainda segurando o cutelo ensangüentado em uma das mãos, o qual eu encarava fixamente.
- Hmm. Quer saber? Relaxa, Fifi. Isso tudo é frescura mesmo. Trabalhe do jeito que você quiser, viu? Só...só lembra de lavar as mãos de vez em quando, tá? Assim, quando der. Sem querer incomodar.
- Ai, moço, adorei!
Feliz da vida, Fifi me puxou para um abraço, apertando minha cabeça entre seus seios descomunais. Seu colo enorme cheirava a uma mistura de suor, Leite de Rosas e fígado bovino. Depois de alguns segundos, o cozinheiro finalmente me libertou de sua demonstração de carinho. Atordoado, cumprimentei os funcionários pelo bom trabalho e me encaminhei para a saída. O gerente, atencioso, me acompanhou durante todo o trajeto. O meu colega já se encontrava do lado de fora do estabelecimento, conversando animadamente com o motorista do veículo da Vigilância Sanitária. Assim que me viram, abriram enormes sorrisos.
- Então, Frederico. Conheceu lá a cozinha?
- Conheci sim. E Fifi mandou um beijo pra vocês dois. – respondi, com um sorriso encabulado.
Os homens mais velhos gargalharam, nos despedimos do gerente e saímos para atender outra ocorrência.
Eu havia sobrevivido ao meu primeiro dia de estágio.

2 comentários:

  1. Cena do abraço com a cara nos peitos = cena de Clube da Luta! Igual a quando Edward Norton abraça Meat Loaf, que tem tetas. Bom, pelo menos eu sei que Fred não ficou traumatizado. Dia desses, eu o vi saindo de uma sauna... Ei, não é pra contar aqui, não?
    Foi mal, cara.

    Ass: Mauro Fofoca

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  2. É... Eu sempre ouvi que estágio serve para aprofundar as teorias, mas tu levasse a sério demais. Saudades de Fifi?

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Vai, danado, reclama!