terça-feira, 20 de julho de 2010

Dia do Amigo: a pelada



 


Difícil não reclamar da idade. Especialmente quando se chega naquela em que a gente sente que consegue continuar fazendo as mesmas coisas de dez anos atrás, mas o corpo, sempre um realista, acaba estilando o esforço e te punindo com cãibras, contusões, hematomas, paradas cardiorrespiratórias e morte. Mas somos teimosos e adoramos sentir que estamos enganando a velhice mantendo os mesmos hábitos da juventude. Desses, o que mais demora a morrer é a tal da pelada. Não, não tô falando daquela sua tia velha que adora se exibir pelada na varanda. Essa aí tem mais é que morrer mesmo. O mais rápido possível. Não, me refiro mesmo à informal partida de futebol entre amigos, geralmente praticada aos domingos por homens sedentários que passam a semana sentados em seus escritórios, onde o maior esforço físico que realizam é apertar o botão da máquina de café expresso. Chega o final de semana e todo mundo pensa que virou menino de novo, realizam um máximo de dois minutos de alongamento antes da partida e acham que estão prontos para passar o dia jogando bola, geralmente na praia mesmo. Por isso que de vez quando a pelada mata um. Sim, nesse caso, pode ser a sua tia velha, de nojo mesmo.

Mas aí, claro, o rendimento não é o mesmo de antigamente. E há uma enorme diferença na forma como a partida se desenrola. Nada de dribles. Dá muito trabalho sair correndo e ainda tentar driblar o adversário. Quando acontece, geralmente é aquela velha puxadinha pro lado, que não engana mais nem a minha avó. Pode ser para esquerda ou para direita, o que dá ao jogador que está tentando roubar a bola 50% de chances de acerto. Se ele, por sorte, for para o lado correto, ótimo. Senão, desiste e deixa o adversário passar, sem nem olhar para trás e rezando para que o zagueiro seja um pouco mais determinado do que ele. A maioria aposta mais nos passes longos, dizendo a si mesmos que os bons jogadores não são os de maior velocidade e sim os que têm mais habilidade na hora de lançar a bola. Geralmente não dá em nada. Ou o passe é tão ridiculamente fraco que acaba no pé do adversário ou tão forte que acaba acertando a cabeça do lateral do time oposto, que aproveita para se fingir de morto e sair do jogo antes de dar mais vexame.

Ninguém se importa de jogar de cara para o sol, ruim mesmo é ter que ficar contra o vento. Nessa situação, a maior parte dos jogadores desiste de avançar e se concentra na defesa, sempre dizendo que é importante reforçar a retaguarda. De vez em quando aparece um mais ousado que projeta o bucho para frente e, aproveitando a inércia, consegue chegar até a área do outro time, lá ficando até se recuperar do esforço, geralmente de cócoras na beira do campo e exibindo um preocupante tom arroxeado no rosto convulsionado. A idade muda até a personalidade dos jogadores. Os fominhas de antigamente, odiados por pegarem a bola e só soltarem quando a partida acabava e o dono exigia a pelota de volta, são os generosos de hoje. Ninguém quer correr o risco de ficar com a redonda no pé e, Deus que me livre, ter que sair correndo com ela. O rodízio de goleiros continua. A diferença é que agora todo mundo quer ficar no gol, posição mais invejada em uma partida na qual o time adversário, bando de perronhas, não consegue lançar um mísero ataque ao campo oposto. É tanta tranqüilidade que dá até para tomar uma cervejinha e bater papo com o vendedor de amendoim.

E eu, que sempre fui o pior dos piores, eternamente pedindo próxima e sendo escolhido puramente em razão de um sistema de cotas de amizade, descobri que, inacreditavelmente, melhorei depois desses anos todos. Na última partida eu corri, lancei, arrisquei alguns dribles desengonçados e até mesmo chutei a bola na direção geral do gol adversário, acertando a velha que passava lá atrás. Estava até bastante orgulhoso de mim mesmo até que percebi que, na verdade, não era eu que tinha progredido em minhas habilidades futebolísticas. Os adversários é que não tinham mais forma física para exibir o futebol arte de antigamente, malandro, maroto, malicioso e, mais importante, móvel. E como os companheiros de time, em sua maioria, se encontram na mesma situação, a pelada fica parecendo mais uma partida de totó, com todos mantendo suas posições e chutando a bola preguiçosamente, somente quando esta, fortuitamente, acaba sobrando para alguém. 

Não, aquele último jogo não foi nada bonito. Os gols só aconteciam por acidente, os jogadores passavam metade do tempo com uma das mãos nas costelas e reclamando de falta de ar enquanto alguns ainda caíam no chão pateticamente, sem nem estarem participando da jogada, e lá ficavam, indiferentes à própria dignidade. Mas foi divertido. Afinal, pelada só merece esse nome quando acontece entre amigos. E dar risada junto com eles é muito, muito melhor do que fazer gol.

Sorte minha, porque eu mesmo não fiz nenhum.

Uma homenagem do Blog da Reclamação ao Dia do Amigo!


5 comentários:

  1. Eu sei que continuo um verdadeiro craque, um ás com a bola nos pés. Na verdade, é com as bolas nos pés, ou seja, ovo arriado. Mas a mensagem importante é: parabéns pelo dia do amigo, pessoal. Amigo é coisa difícil de ter, principalmente nos dias de hoje, onde a gente vê a galera passando a perna nos outros, roubando, falando mal. Só peço que não façam tatuagem com meu nome nas costas. O último caso que vi disso deu em cadeia pros dois.

    Ass: Mauro, o eterno craque, Pelé branco das peladas e galhofeiro (chuto com os dois pés e não caio).

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  2. Adorei o texto. O bom de ter amigos é que podemos estar fazendo NADA e ainda assim os nossos momentos juntos ter todo um sentido...Feliz dia do amigo, não só hoje...mas em todos os dias...

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  3. hahah, quase chorei, que munito AL fredo!!!

    =P


    Evinha, bem chatete

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  4. Na ultima pelada, tivemos momentos de futebol arte, desempenhados principalmente por nossos amigos neném e Daniel

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  5. kkkkkkkkkkkkkkkkk
    justa homenagem.
    cada um tem os amigos e companheiros de time que merece!! :P
    Déa.

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Vai, danado, reclama!