quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Natureza desumana






E a mania, agora, é ser verde. Sustentável. Reciclável. Reaproveitável. E, algumas vezes, execrável. Não me entendam mal. Sou super a favor do meio-ambiente, até porque eu estou inserido nele. No calor, no barulho e no aperto, mas ainda assim faço parte. Acontece que tem gente que exagera. Na ânsia de salvar a mãe-natureza (e, se der tempo, os seus filhos, esses babuínos falantes chamados seres humanos), tem pessoas por aí cometendo algumas loucuras básicas. Tipo, fuçar resto de comida no lixo alheio. Tudo em nome da sustentabilidade e visando diminuir o desperdício, claro. Tenho certeza que deve existir um lugar no céu só para esse povo, conhecidos como Freegans. Sabe, com muitas árvores centenárias, ursos panda e baleias jubarte discutindo Foucault animadamente, além de fileiras e mais fileiras de latas de lixo transbordando de comida vegetariana. Nada disso é para mim e tenho uma cota reservada de maldades para garantir que eu jamais passe a eternidade convivendo com esses malucos no mesmo pedaço de nuvem.

Por outro lado, boa parte da sociedade não está nem aí para o planeta Terra e sua continuidade em condições mais ou menos salubres. É gente que até tem alguma ideia dos problemas ecológicos que o mundo, como um todo, enfrenta atualmente, mas não se importa o suficiente ou simplesmente não sabe o que fazer para ajudar. No meio dessa confusão toda ficam os equivocados, que acham que estão dando uma força para o meio-ambiente, mas na verdade estão simplesmente seguindo a modinha verde, sem muita noção do que está fazendo ou do impacto real de suas ações. É o cara que quer entrar em contato com a natureza e vai acampar com o seu jipe 4X4 a diesel, usando GPS ching-ling fabricado por criancinhas chinesas e uma barraca de camping mais confortável (e mais cara) do que todo um conjunto de casas populares.

Aliás, um dos grandes problemas de se incutir o instinto de sustentabilidade na maioria das pessoas é que muita gente associa essa mudança de atitude com mais trabalho e/ou maior custo. A verdade é que o bolso continua sendo o órgão mais sensível do homo sapiens, e qualquer ameaça de golpes nessa área sensível do corpo faz com que o indivíduo automaticamente se torne resistente a mudanças. Na encruzilhada entre fazer o certo ou o barato, advinha o que o cidadão médio escolhe?


- Pizzaria Verde, boa noite.

- Boa noite. Amiga, me veja aí uma pizza metade bacon, metade calabresa. Quer dizer, metade bacon, metade marguerita. É mais saudável e ecológico, né?

- Perfeitamente. O senhor gostaria que a entrega fosse feita por um ciclista, sem impacto para o meio-ambiente, ao custo de R3,00 e mais quinze minutos de tempo de espera? Ou prefere que seja feita por um caminhão movido a lixo radioativo, filhotes de labrador e lágrimas de órfãos escravizados a R$ 2,50?

- Segunda opção. Aproveita e muda o sabor pra metade bacon, metade bacon. Com uma porção de bacon por cima. E pau nesse órfãos, que eu tô morto de fome.


Pois é. Não dá para salvar o planeta antes de resolvermos o problema da natureza. A humana. Até lá, o mundo vai continuar indo ladeira abaixo. E vai chegar um momento em que estaremos todos na mesma situação.

Procurando comida em lata de lixo.