segunda-feira, 24 de outubro de 2011

As recifenses, parte 2: só na conversinha





Todo mundo sabe que as mulheres falam em um dialeto próprio, cheio de significados ocultos, frases de duplo sentido e armadilhas semânticas nas quais até os homens mais experientes estão passíveis de cair. Mas quando falamos das recifenses, a coisa assume proporções assustadoras. A mulher da capital pernambucana possui o poder de confundir os homens e transformá-los em tabacudos incontroláveis. A sua mente femininamente malévola é capaz de engendrar os diálogos mais obtusos, fazendo com que os homens percam não apenas a paciência, mas também a sanidade e a esperança de um amanhã melhor. Ao conversar com uma dessas amazonas tropicais, o homem já começa o diálogo derrotado e tudo o que pode fazer é tentar, ao menos, compreender o que diabos está se passando ali. Não é fácil. Djavan, que sem dúvida sobreviveu a alguns diálogos com as mulheres do Recife, sabe bem como é. Em um raro momento de coerência lírica, ele descreveu exatamente o que acontece todas as vezes em que um homem tenta estabelecer contato com a fêmea local.


Eu levo a sério, mas você disfarça
Você me diz à beça e eu nessa de horror
E me remete ao frio que vem lá do sul
Insiste em zero a zero e eu quero um a um
Sei lá o que te dá que não quer meu calor
São Jorge por favor me empresta o dragão
Mais fácil aprender japonês em braile
Do que você decidir se dá ou não


O que nos leva a um dos fenômenos mais comuns da relação homem/mulher na capital de Pernambuco. A enrolação. Claro, ninguém supõe que a mulher, ainda que esteja doida pelo cara, vá se jogar no colo dele enquanto arranca a própria calcinha com uma das mãos e com a outra vá fazendo sinal para o táxi mais próximo. Acreditem, já sugeri esse tipo de estratégia e minha noite sempre terminou na delegacia. Ao menos lá eu sempre arrumava companhia. Várias companhias. Companhias brutas, que não aceitavam um “não, pelo amor de Deus, lá não!” como resposta. Mas eu divago. Enfim, ninguém espera esse comportamento. Mas o jogo duro local é algo lendário e a recifense quase sempre sente que, caso o homem não termine a noite lambendo o salto do seu sapato, ele não se esforçou o suficiente e, portanto, não passa de um pobre coitado morto nas calças cordão molhado que mija no pé. Daí que surgem os diálogos típicos da balada do Recife.


Mulher recifense 1: Ai, meu Deus, ele tá me olhando! Ele tá me olhando!

Mulher recifense 2: Calma! Não fique nervosa! Tudo bem, ele parece uma mistura de Gianechinni com Johnny Depp, mas mantenha a calma! Jesus, Maria e José, um homem desses lá em casa...

Mulher recifense 1: E o sorriso? Parece ser uma simpatia ele, ai que sonho...

Mulher recifense 2: Eita! Lá vem ele! Vai falar contigo! Postura amiga, postura!

Homem perfeito: Oi, boa noite, tudo bem?

Mulher recifense 1: E então.

Mulher recifense 2: Tudo indo.

Homem perfeito: Ah, que...bom. Então. Eu sou novo aqui na cidade, não conheço ninguém.

Mulher recifense 1: Sei.

Mulher recifense 2: Que cu, heim?

Homem perfeito: É...pois é. Será que...será que vocês se importavam de eu sentar aqui na mesa com vocês?

Mulher recifense 1: Tá me achando com cara de puta?

Homem perfeito: ...oi?

Mulher recifense 2: Tá pensando o que da minha amiga? Que ela é rapariga? É? É?!

Homem perfeito: Não! De jeito nenhum! Eu só queria...eu...eu nem sei o que significa essa palavra! Mas eu não tava pensando isso não! Só queria conhecer vocês melhor e...

Mulher recifense 1: Ah, aí pensou que só era chegar chegando e tava tudo certo, né?

Mulher recifense 2: Que era só ser bonito, simpático e educado e já ia dar uns pegas na minha amiga, né? Amiga, deixa eu ver aqui a tua testa rapidinho. Não, não tá escrito “VEM QUE EU TÔ FACINHA” não. Só ele que leu isso mesmo.

Homem perfeito: Mas eu...eu nem...

Mulher recifense 1: Vem de fora e pensa que vai passar o rodo aqui, né? Cabra safado! Ah, se eu ainda andasse armada...

Mulher recifense 2: Aposto que tem pau pequeno. Repara só. Tem pauzinho, né? Por isso anda de carrão importado, tinha que compensar alguma coisa.

Homem perfeito: ...

Mulher recifense 1: Olha a carinha dele. Vai chorar, é? É mulherzinha, é?

Mulher recifense 2: Isso, sai correndo! É o melhor que tu faz! Seu bosta!

Mulher recifense 1: Ai amiga...ele foi embora mesmo!

Mulher recifense 2: Já desistiu? Por isso que não tenho paciência com homem de fora.

Mulher recifense 1: E olha que eu facilitei, heim?

Mulher recifense 2: Demais. Tava ficando feio já, amiga. E outra. No mínimo, ele era frango. Relaxa.

Mulher recifense 1: Ai, ai...mas era um gato, viu?

Mulher recifense 2: Ô lá em casa...


Pois é. Não é fácil. Mas pode ficar pior.

Bem pior.