sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Texto de convidado: Morar em casa – Os vendedores




Estimulado por um texto de Fred sobre vendedores de rua, eu já falei n’O Blog da Reclamação sobre as agruras de morar em uma casa e as figuras que batem à sua porta. No comentário eu juntei tudo no mesmo saco, mas agora vejo que são duas categorias que merecem atenção individualizada. Vendedores e “Artistas”. Comecemos pela primeira. Em tempo: os vendedores de comida (macaxeira, tapioca, japonês, cuscuz, amendoim, algodão doce, cavaquinho, pirulito, sorvete, etc) estão perdoados, por se incluírem na categoria “Patrimônio Gastronômico”.

Há os vendedores de gás de cozinha, de panos de prato – tem um que bate todo sábado à minha porta, só porque há mais de UM ano eu comprei UM pano de prato dele. Ele fala como se todo dia eu adquirisse um dos pedaços de tecido pintado que ele vende. “Vai querer pano de prato de novo?”.

O carro do gás deveria ser visto como um “case” de propaganda esdrúxula.  A música diz, exatamente: “Quero Gás, Quero Gás, feito pra você. Peça gás, peça gás, pra sentir prazer”. Como assim? Se insinuando para o botijão? Pelo menos você teria um parceiro “com todo o gás”, se é que vocês me entendem. O máximo que eu vi alguém conseguir foi a personagem de Magdale Alves no curta “Eletrodoméstica”, de Kleber Mendonça Filho. E era com uma lavadora de roupa, que afinal tinha um papel ativo na história. Mas sentir prazer comprando gás... Só se seguirmos o exemplo de outra personagem, a do “homem do gás”, da banda Tanga de Sereia. E pra mim teria que ser a mulher do gás. 

Os vendedores clássicos seriam os de livros e enciclopédias. Mas, mutacionada pelos sucessivos portões e portas na cara, a espécie evoluiu. Hoje são ex-drogados (ótimo disfarce! Seriam as drogas as enciclopédias que comercializavam antes?). Vendem livros infantis e de auto-ajuda. Vendem, não, divulgam. E você não compra, contribui para obras de apoio à recuperação dos viciados em drogas e, de brinde, leva o livro. Porém o mais surpreendente, pra não dizer desconcertante e sacana, é a abordagem. Confesso que fui vítima de uma. E caí como um patinho. Na verdade acho que acabei de insultar o patinho. Mas vejam se vocês não cairiam também.

Manhã de quarta-feira. Trabalhando em casa e concentrado na redação de um texto de pesquisa, tive um sobressalto com a campainha. Ainda pensando na próxima linha, cheguei ao portão. Aqui um alerta: morando numa casa, JAMAIS chegue até o portão sem pensar pelo menos cinco vezes. É meio caminho andando pro vendedor. Mas lá estava eu, indefeso devido à minha leseira e pensamento voltado para o trabalho. “Sopa no mel”, deve ter pensado o vendedor. Embora eu jamais tenha entendido que manjar gastronômico resultaria dessa mistura, tenho a certeza de que foi isso que ele pensou. E aí atacou sem piedade, falando da instituição que abrigava jovens envolvidos com drogas em todo o Brasil e que dava esperança a várias famílias, salvando vidas e tudo o mais. Eu só queria resolver coisas. Meu texto, a pesquisa, minha vida profissional. Tinha alguém ali pra resolver o problema dos jovens drogados. Quase que automaticamente abri o portão. Outro lembrete: se for até o portão, nada de levar controle remoto ou chaves. Nunca. Eu levei o controle remoto. Estava preso à bermuda. Depois de falar um pouco mais sobre as ações da sua entidade, o rapaz – isso, era um rapaz, vinte e poucos anos – deu o golpe de misericórdia naquele morador de casa incauto. “O senhor daria um abraço em um ex-drogado?”. E você, leitor, daria? Inebriado por tanta boa vontade e fraternidade, disse que sim. Ele não perdoou. “Eu sou um ex-viciado. O senhor me daria um abraço?”. Desse jeito. E abriu os braços. Né de lascar? Ainda tive atividade cerebral suficiente pra lembrar que a minha carteira não estava no bolso, mas dei o danado do abraço. A vizinha da frente viu e até hoje deve achar que sou viado. Meu cachorro latiu ferozmente, considerando que eu estava sendo atacado, o que chamou a atenção de outro vizinho, que é viado, e deu um sorrisinho cúmplice. Mas o prejuízo maior foi financeiro, mesmo. Finalmente desperto e rendido por ter caído na armadilha, não resisti muito a comprar um livro por cinco reais. E o vendedor ainda achou pouco. Depois que foi embora, rasguei e joguei fora o livro, numa ira pra lá de atrasada. Nunca mais o  indivíduo apareceu na minha porta. E eu doido que voltasse - treinei o cachorro e tudo o mais -  pra ele ver como se trata de verdade um neovendedor de enciclopédia.

Links

Clipe “O homem do gás” -
www.youtube.com/watch?v=zh1ZV2XH1TU 

Curta “Eletrodoméstica” -
http://portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=3293#

Por Alberto Penaforte, autor do blog Rádio Gastronomia

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Só mais um post roubado

Post roubado do ótimo blog de Marina, o Do Fundo do Mar. Extremamente relevante e verdadeiro. Blogueiros também tem coração e precisam de atenção!

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Breve Comentário



Sabem qual é o item que considero mais importante num blog? O post, você diria? Não; são os comentários. O post não é assim tão importante. Não precisa ser longo, não precisa ser escrito com palavras complicadas, não precisa ser escrito com orações longas. Não precisa sequer ser escrito. Não precisa fazer sentido. Um post pode ser uma frase, um pensamento, uma imagem. Uma tirinha. Uma simples palavra pode ser um post.

E os comentários? Os comentários são como posts publicados no blog de outra pessoa. São uma demonstração de que você leu o texto, gostou e tem algo a dizer sobre ele. Ou será que não tem nada a dizer? Como bem disse o Tyler no twitter, uma vez: "quando o post tem poucos comentários, você fica com a sensação de que ele não agradou". É como uma piada sem risadas. Ou um concerto sem aplausos. 

Eu acho engraçado que as pessoas tenham tanto a dizer no twitter — às vezes, uma besteira maior que a outra — e não tenham nada a dizer de textos que leem em blogs. Bons textos de excelentes blogs. Comentários são incentivos. Nem todo mundo precisa de incentivos para continuar um projeto. Mas é sempre bom.


"O autor daquele blog é alguém que, muitas vezes, passou horas escrevendo o melhor texto possível, com o objetivo de fazer você gargalhar na hora do almoço, chorar no meio da madrugada, aprender algo novo ou passar o resto do dia pensando em algo que você nunca tinha percebido antes.

E tudo o que ele quer em troca destas horas que ele usou escrevendo para você é um comentário que levará apenas um minuto para ser escrito.

Você não acha que vale a pena?"

Por Rob Gordon

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Triste História

Resolvi retornar ao curso de História como aluno especial de uma disciplina, para me preparar para um eventual mestrado e também para voltar ao ritmo de estudos. Como era de se esperar, o professor passou uma lista de livros e pediu que os alunos os resenhassem, enfocando certos aspectos das obras. Levei meu trabalho na aula seguinte e, apesar de não ter tido muito tempo para fazê-lo, estava razoavelmente orgulhoso das minhas cinco páginas de análise, onde eu dava a minha opinião sobre o que eu tinha lido. Não estava uma obra-prima, mas imaginei que os outros alunos estariam mais ou menos no mesmo nível.
Nos sentamos todos ao redor de uma mesa e o professor, grave, apontou para um dos estudantes arbitrariamente.

- Fulano. Você. Comece com seu trabalho.

O rapaz em questão pigarreou e organizou suas anotações. Prestei atenção para identificar logo o que eu poderia acrescentar ou cortar da minha resenha. Não deveria ter lá muita diferença entre os trabalhos.

- Bem, professor. Ao ler o texto, cheguei à conclusão que o discurso do autor em questão está carregado de elementos semióticos, calcados em uma visão quase rosseuniana das relações interpessoais, enfatizando práticas memorialistas que se intercalam e se auto completam, formando um todo de complexidade polissêmica, onde os signos e símbolos explorados se comunicam entre si em uma linguagem prosopográfica, cuja subjetividade oculta uma certa medida de Proust ou mesmo de Chartier, cedendo lugar à vivências registradas sob um ponto de vista anímico, enfocando, em suas entrelinhas, a perda da inocência e a incongruência vivenciada pelo autor em seu habitus pessoal, concorrendo para a formação extra historiográfica do mesmo, contudo sem jamais deixar de apresentar um discurso regionalista e, até certo ponto, puramente individualista.

Olhei para o aluno, boquiaberto. Não conhecia metade das palavras que ele havia usado e nem tinha chegado perto de arranhar a superfície do livro. O cara devia ser um gênio ou algo assim. Olhei para o professor, que cofiava sua barba grisalha da forma como apenas uma autoridade de História pode fazê-lo. Certamente, ele iria cobrir o rapaz de elogios, talvez até mesmo sugerir que ele engatasse um doutorado direto.



 Na foto: a face da simpatia.



- Superficial. Bastante superficial. Esperava mais de você. – sentenciou o mestre, seco.

- Desculpe professor. Dediquei apenas doze horas diárias à elaboração deste trabalho. Ando meio sem tempo ultimamente. – respondeu o estudante, humildemente.

- Hmm. Isso não justifica. Seu texto está primário, na melhor das hipóteses. – ao redor da mesa, os outros alunos balançavam as cabeças em concordância, não pude perceber se com sinceridade ou por puro nervosismo.

- Mas professor...este foi apenas o parágrafo introdutório! Tenho certeza de que nas próximas trinta e sete páginas o senhor vai perceber que eu consegui, até certo ponto, captar a ideia passada pelo autor. – olhei para o meu trabalho de cinco páginas e imediatamente minhas pernas começaram a tremer violentamente.

- Talvez. Francamente, eu duvido. Deixe o trabalho aí do lado que eu darei uma lida em casa, mas já vi que, infelizmente, não posso esperar demais.

- Sim, professor. Me desculpe. O próximo sairá melhor, garanto.

- Não garanta o que você não pode cumprir com absoluta certeza. Bem. Vejamos agora se temos algum trabalho digno de nota aqui.

Baixei a cabeça, o suor porejando minha testa. Depois que eu lesse minha análise, teria sorte se o professor considerasse o material digno de papel higiênico. Minha única esperança era que Deus permitisse que eu acabasse ficando por último e aí talvez não desse mais tempo de eu apresentar meu trabalho.

- Deixe-me ver aqui na chamada. Sim. Frederico, sua vez agora.

Soltei um palavrão mental e coloquei Deus de volta à minha lista negra. Um dia eu teria minha vingança, mas naquele momento eu precisava pensar em uma saída. E rápido. O professor me observava por trás dos óculos de lentes grossas. Meus colegas pareciam exibir em suas faces aquelas estranha mistura de pena e excitamento que sentimos ao acompanhar um animal sendo levado ao abate. Não podia mais postergar. Me levantei lentamente, olhei ao redor e fiz a única coisa honrada em tal situação.

- Professor, minha avó morreu!

- Como?!

- Sim! Isso mesmo! Ela morreu! Acabei de ficar sabendo! – sentados à mesa, os outros alunos trocaram olhares nervosos.

- Mas...como você sabe? Você não atendeu o celular em nenhum momento!

- Pois é...pois é professor. Mas é que eu e minha avó, a gente é muito ligado, sabe? Quer dizer, era, já que ela bateu as botas. Mas enfim, eu meio que senti, sabe como é?

- Não, não sei. – retorquiu o professor, franzindo o cenho perigosamente.

- Bom, mas então. Preciso ir. Funeral sem a minha presença não ia ser a mesma coisa. Nessas ocasiões sou eu que faço o discurso. – gaguejei, enquanto arrumava minhas cosias e jogava meu trabalho de qualquer jeito para dentro da mochila.

- Mas Frederico...

- Até a próxima, professor! Pessoal, valeu aí a força, heim? Boa sorte aí pra vocês e a gente se vê na próxima aula.

Saí da sala apressadamente e corri para o elevador, respirando aliviado.

Nunca mais voltei para a aula.

domingo, 19 de setembro de 2010

Domingo é dia de enquete!



Opa, o domingo já chegou? Confiram aí os resultados da última enquete!


Hoje foi o dia da Parada da Diversidade no Recife, maior demonstração de orgulho gay do Norte-Nordeste do Brasil, reunindo milhares de pessoas nas ruas. Sua cidade também tem uma manifestação assim? Se sim, o que você faz nessas ocasiões?

1- Boto minha roupa de Lady Gaga e AR-RA-SO na avenida, baby! Te vejo por lá! (36%)
 
2- Me escondo debaixo da cama até acabar. Prefiro não arriscar, vai que eu me animo. (0%)
 
3- Distribuo panfleto. Ser cabo eleitoral é uma merda, viu? (18%)
 
4- Não faço nada. Eles é que fazem comigo. Que foi, tá olhando o quê? (45%)
 
E os resultados mostram que os leitores do Blog da Reclamação são pessoas inteligentes, modernas, tolerantes e que permitem que totaias estranhos façam coisas inomináveis com elas no meio da Parada Gay. Gosto não se discute.
 
Obrigado a todos os que votaram e se liguem já na próxima enquete!