quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Carnaval de regras, parte I







E o Carnaval finalmente chega ao fim, junto com a paciência, o dinheiro e a esperança que muita gente por aí ainda tinha de casar de branco ou de chegar aos trinta sem descobrir que é pai. Os cariocas acompanharam o desfile das escolas de samba pela TV, os paulistas fizeram confusão imitando o Carnaval carioca, os baianos se arrastaram ao redor dos trios elétricos enquanto os turistas brancos pulavam dentro dos cordões de isolamento e quem ficou ou veio para Recife/Olinda, aproveitou o Carnaval de rua, característica da tradição local, desprovido de abadás de estética duvidosa e ex-BBBs seminuas, mas ainda assim apreciado por muita gente. Vai entender esse povo. A bagunça da folia pernambucana é a um só tempo seu grande trunfo e sua maior fraqueza. Sem regras muito claras, cada um faz seu próprio Carnaval, brinca como quiser e é livre para fazer tudo aquilo que as amarras sociais e familiares impediram durante todo ano. Sim, vovó, estou falando da senhora. Depois conversamos sobre isso. E, por favor, devolva a minha fantasia de Gretchen.

Mas eu divago. Sim, o lado ruim da festa da carne em Pernambuco é o excesso de democracia. Não há seguranças segregando e ditando regras, as troças carnavalescas não recebem notas nem são julgadas por ninguém e a única lei é: não toque Axé. Mas aí já é bom-senso mesmo. Coisa que, durante o Reinado de Momo, parece ser mais raro do que político honesto no Brasil. De forma que o Blog da Reclamação, sempre atento ao seu papel civilizatório, resolveu tomar para si a ingrata, ainda que necessária, tarefa de educar as massas incultas que se aglomeram nas ladeiras de Olinda e nas pontes do Recife, visando ajudar a perpetuar um Carnaval socialmente mais organizado e sexualmente menos constrangedor. Turistas e nativos, sigam essas regras básicas e, ano que vem, diminuam o risco de aparecerem em posições comprometedoras no redtube ou de levarem um tabefe merecido enquanto disputam com um mendigo um lugar para dormir na sarjeta.


- Você não nasceu encangado: Tudo bem dar as mãos para não se perder do seu grupo/namorado/peguete/cafetão no meio da folia, mas não vamos exagerar. Tem gente por aí fazendo filas de 17 pessoas, braços dados, querendo sair da Ladeira da Misericórdia em Olinda e chegar na Praça do Marco Zero, no Recife, unidos como uma centopeia humana e achando que o Mar Vermelho de mundiça vai educadamente se abrir à passagem daquele Moisés coletivo. Não vai e a corrente humana atrapalha, irrita e não faz sentido. Se seu grupo é grande, fragmente-o em porções menores e mais manejáveis de no máximo três indivíduos e combine um ponto de encontro caso alguém se perca. Os marinheiros de primeiro Carnaval, os inseguros e os extremistas podem tatuar um mapa nas costas mostrando locais de apoio e o endereço da casa/hotel onde estão. Supositórios com capacidade de GPS são opcionais para os mais dementes e/ou festeiros.

- Você será julgado pela sua fantasia (ou pela falta dela): Uma das coisas mais legais do carnaval é botar uma fantasia e fingir, por alguns dias ou horas, que a gente é outra pessoa. Só que para cada roupa existe um arquétipo associado, firmemente enraizado no inconsciente coletivo dos bêbados carnavalescos. E é através desses estereótipos que as pessoas vão te enxergar. Por isso não adianta inventar: vá para a folia ciente das reações que sua fantasia vai despertar. Homens anabolizados que se vestem de anjinho/cupido/espartano/Adão/naturista/bebê/Hulk/banhista/salva-vidas/feto ou qualquer outro personagem que exija peças mínimas de roupa já vão sabendo que chamarão atenção apenas da parcela gay do Carnaval. O lance é aceitar a situação e fincar o pé na Rua 13 de maio, em Olinda ou encher a cara e terminar o dia beijando a tia da cerveja. Não há opções intermediárias. Já as meninas que colocam uma fantasia sensual, estilo freira endiabrada ou noiva ninfomaníaca têm todo o direito de se indignar com os imbecis que, entra ano, sai ano, tentam beijá-las á força. O que elas não podem fazer é se lamentar por não terem achado o homem da vida delas, apenas um caso grave de mononucleose. Os desprovidos de imaginação, os desorganizados ou os que acham que usar uma fantasia no Carnaval, por incrível que pareça, é queimar o filme, acabam amargando uma experiência pela metade, com foliões inconvenientes e alcoolizados perguntando insistentemente “E essa fantasia de turista aí, deu trabalho pra fazer?”.



Continua...