quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Vida de N3rd: a Lan House, parte I

Meu primeiro emprego selou de vez o meu destino nérdico: atendente de Lan House. Isso foi no começo do século, no bairro de Boa Viagem, zona sul do Recife, lá pelos lados do colégio Contato, que hoje já nem existe mais. Eu era jovem, inexperiente e muito mais mal-humorado do que sou hoje em dia. Enxergando aí as habilidades necessárias para o cargo, meu amigo René, o gerente, me ofereceu a vaga, a qual eu aceitei feliz da vida, já que imaginava ser a ocupação perfeita para mim. Na minha cabeça, meus dias iriam se resumir a surfar na Internet utilizando a vertiginosa conexão de 128k a que tínhamos acesso, jogar todos os games do mercado e descansar na enorme poltrona que ficava atrás do balcão, dominando todo o ambiente devidamente climatizado.




 Naquela época, tudo era mais diversificado.




Pois é. Além de ingênuo, nessa época eu era também um pouco bobo. Trabalhar em uma Lan House estava longe de ser o sonho de qualquer garoto nerd, por uma infinidade de motivos. Um deles era os clientes, já que lidávamos com crianças que se inseriam em uma faixa etária que variava entre 10 e 55 anos de idade. A meninada era mal-educada, fedorenta, feia e juro que a maior parte deles sofria de alguma deficiência mental e/ou desvio moral. Nos dias de hoje, a maior parte deles pode ser encontrada nos noticiários policialescos estilo Cardinot, protagonizando atos criminosos dos mais vis, mas ao menos estão todos com boa saúde. 


 Fred, rapaz, quanto tempo!
 

Os garotos costumavam passar as manhãs gazeando aula, jogando e gastando o dinheiro do lanche na Lan House, de forma mais ou menos impune, o que sem dúvida diz alguma coisa do nosso sistema educacional. De vez em quando, algum pai descobria a pilantragem e ia bater na Lan atrás do filho. Dependendo da raiva, baixava o cacete no menino ali mesmo, fato que era acompanhado pelos estressados funcionários com sinais afirmativos de cabeça, sorrisos sádicos e ocasionais gritos de “Chuta o ovo!”.

Mas a clientela, apesar de jovem, era bem esperta e esses episódios eram infrequentes. Muitos preferiam não arriscar a pisa e iam jogar antes ou depois das suas aulas, à noite ou nos finais de semana e feriados. Passavam horas competindo e berrando ensandecidamente uns com os outros, comendo porcarias (vendidas por nós mesmos) e tornando o banheiro um lugar inóspito para formas de vida humanas. Os meninos eram tão boca-suja que eu aprendi mais palavrões trabalhando na Lan House do que em toda a minha infância no Janga, um lugar onde cumprimentávamos nossos amigos mais queridos xingando as mães uns dos outros. Era necessário cadastrar os clientes para liberar o acesso à máquina, de maneira que a meninada aproveitava para criar os nomes de usuário mais pornográficos possíveis. Os logins geralmente consistiam em uma combinação de uma referência bélica qualquer, um palavrão e um grande número de absurdos e desnecessários símbolos comumente associados à tipografia encontrada na Internet. Nosso banco de dados estava abarrotado de usuários como Bucet@_eXplosiv@, Tiro%ne$$e%Karai ou Bilol@deBazuK@. Bala_nufuriku era um dos nossos melhores clientes. Como todos se tratavam pelos apelidos, os próprios funcionários acabavam esquecendo os nomes de batismo da criançada e passava a se referir a eles usando os de guerra mesmo. De vez em quando, algum moleque pedia para ligar para os pais, para que o fossem buscar na Lan House. Quando o funcionário de distraía, esse tipo de diálogo podia acontecer:


- Alô? Dona Fulana? Aqui é Frederico, da Lan House. Isso, da Lan House. Lan-Rau-Si. Pronto. É que #minh@rol@ tá aqui em pé na minha frente, chamando pela senhora.

- Como é que é?!

- Putamerda! Não, quer dizer, putaquepariu! Quer dizer...ah, deixa pra lá. Tu, tu, tu...

- Alô?


Sim, era costumeiramente constrangedor, frequentemente insalubre e era tudo feito por um salário mínimo. 8 horas por dia. Mas nada é tão ruim que não possa fica pior.

Muito, mas muito pior.


Continua...

4 comentários:

  1. Muito bom! Ri demais com o texto!
    abraço

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  2. Opa frederico, vamos botar essa idéia para frente... vê lá quem é afim provar umas artesanais, a gente podia marcar um jantar de harmonização entre cervejas e alguns pratos. Podemos até tentar em algum restaurante. limite de 20-30 pessoas, estilo menu confiança. Podemos até fazer beneficente, já que é mais para divulgar a cultura do que ganhar dinheiro...

    Abraço

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  3. kkkkkkkkkkkkkkkk
    Muito bom!Mas não demore muito com a continuidade.
    :****

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  4. hahaha, até que me provem o contrário, continuo pagando pau p blog!!

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Vai, danado, reclama!