segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O valor do tempo, parte I










A não ser que você seja algum tipo de bilionário ou simplesmente cronicamente irresponsável, é provável que você precise controlar bem os seus gastos baseando-se, claro, na sua renda fixa. A maioria das pessoas que trabalham, mesmo as que não têm carteira assinada, conta com o salário, que chega todo mês em um valor pré-determinado e, geralmente, imutável. Já professores, especialmente os de inglês, costumam receber por hora-aula, o que muda totalmente essa dinâmica. O leitor atento pode até argumentar que no final dá tudo na mesma, já que as horas são pagas no final de cada mês, devidamente somadas. Tecnicamente, isso seria verdade, não fossem por duas questões. A primeira é que, devido à faltas, aulas extras e substituições, o salário tende a flutuar. A segunda questão é de ordem psicológica. Enquanto a maioria dos profissionais vai trabalhar ciente apenas do quanto vai receber no final do mês, o professor sabe exatamente o valor da sua hora de trabalho e simplesmente não consegue parar de pensar nisso.

A hora-aula é uma realidade tão presente na vida do professor que ele acaba atribuindo valor a tudo baseando-se nela. Cada gasto é comparado com o tempo em que você passa dentro de uma sala de aula, exposto ao mau humor, germes, problemas psicológicos e, em muitos casos, a pura e simples estupidez dos alunos. Os mais necessitados ou gananciosos se tornam paranoicos, contabilizando as horas do dia em função do quanto poderiam estar ganhando. Quaisquer outras atividades são vistas como supérfluas. Para que almoçar, dormir, tomar banho e outras bobagens sem sentido quando se pode estar dando aula? Horas gastas são aulas perdidas e menos dinheiro no final do mês. E no momento de finalmente fazer uso do suado e merecido dinheiro, o professor, embrutecido por anos e anos compostos das mais amargas horas, dias, semanas e meses-aula, não consegue deixar de comparar todos os seus investimentos com o tempo gasto trabalhando. Conheço um professor que, ao se permitir almoçar fora de tempos em tempos, sempre se sentia deprimido ao acabar de se alimentar, já que o valor da refeição se equiparava ao de sua hora-aula. Pior ainda, tinha por hábito comer depressa, gastando em meia hora o que levava uma para receber.

E essa obsessão acaba dominando a vida do professor. Ao ponto em que fica difícil viver e conviver com alguém que, por não conseguir parar de pensar no valor do seu tempo, jamais consegue relaxar ou mesmo funcionar como outros seres humanos normais.

E, depois de alguns anos nessa pisada, a tendência é piorar.


Continua...

Um comentário:

  1. Uma das profissões mais importantes e talvez a menos valorizada.Realidade,absurda!
    E esse texto está ótimo.kkkkkkkkkkk
    :***

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Vai, danado, reclama!