quinta-feira, 24 de junho de 2010

É tudo pelo salário II




O professor de Inglês era um homem preparado. Sabia dos perigos inerentes à uma aula para crianças, uma ocupação das mais insalubres, na sua opinião. Acreditava sinceramente que deveria receber algum tipo de abono específico para aquele trabalho. Mas não havia tempo para tais considerações naquele momento. Abrindo sua pasta, sacou de lá sua arma secreta: vários kits de arte com todo o necessário para transformar seus alunos em coelhinhos da Páscoa. Ao verem o material, os garotos pararam subitamente a algazarra que vinham fazendo até então, encarando fixamente as mãos do professor que, satisfeito com o efeito que havia provocado, agora se deleitava em ter a atenção total dos seus pequenos alunos. Uma das meninas apontou para um pequeno diadema que repousava entre os dedos do educador e falou “Orelha de coelhinho”. O professor sorriu sem humor e disse “Não, de Bunny!” As crianças se entreolharam, confusas. A menininha, munida da resolução e confiança adquiridas em 3 anos de existência, insistiu “Coelhinho”.
O sorriso do professor vacilou alguns milímetros. A garota virou-se para sua amiguinha, que naquele momento se ocupava em tentar alcançar o próprio nariz com a língua, e disse “Coelhinho”. A segunda menina parou imediatamente o que estava fazendo e ecoou “Coelhinho”. Logo, todas as crianças voltavam a repetir a palavra, inspiradas pela resistência da carismática menina. A jovem líder se virou para o professor e soltou uma risada infantil, que para os ouvidos do instrutor não soou menos do que satânica.
O professor sentiu a veia da sua têmpora saltar no ritmo do seu coração. Tinha as mãos úmidas de suor e decidiu, por fim, atacar o problema de frente. Era preciso destroçar o espírito daquela pequena anarquista, de maneira que seus coleguinhas parassem de segui-la, traumatizando-a a um ponto tal que ela passaria a aceitar qualquer coisa que ele ensinasse, de forma plácida e subserviente. Tudo para o bem dela, claro. Pensou furiosamente. Como aniquilar a força de vontade de uma adversária tão formidável? Subitamente, a resposta chegou a sua mente. Estava bem na sua frente.
Já sabia como obter sua vitória através do mais puro sofrimento infantil.

4 comentários:

  1. Tchamm!!! Suspense!!! Conflito!!! Remela!!! Baba!!! Injúria!!! Aguardem!!!

    Ass: Mauro, o rei da galhofa na espera...

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  2. Já estou roendo as unhas de tanta ansiedade! :P

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Vai, danado, reclama!