quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O pior da doença










A não ser em casos comprovadamente insanos, ninguém gosta de ficar doente. Além do fato de te fazer perder compromissos de trabalho, estudo e, se você der azar de verdade, sexuais, a doença ainda pode ter consequências bastante desagradáveis, dependendo de qual seja. A maioria de nós está fadado a pegar ao menos algumas das moléstias menos sérias que estão sempre por aí, atrapalhando nossas vidas, mas que não são graves o suficiente para te fazer começar a escolher a cor do caixão. Pode ser uma gripe ou um resfriado. Talvez uma conjuntivite, de leve. Até enxaqueca conta. Já vi gente que deixou de ir trabalhar por conta de unha encravada depois da pelada do domingo ou cãibras fortíssimas em músculos que eles nem sabia que existiam, depois de uma noite de paixão particularmente intensa.

Mas, de vez em quando, aparece alguém com alguma doença um pouco mais séria do que o normal. O ser humano, mórbido que é, parece adorar a oportunidade de comentar a enfermidade alheia, dando palpites abalizados sobre tratamentos milagrosos e, o que é mais comum, aproveitando para falar daquele primo da tio do cunhado da amiga da amante do frentista do posto perto de casa, que apresentava exatamente os mesmos sintomas que você, só que com consequências desastrosas e quase sempre fatais para o infeliz em questão.

- Fred, meu filho, que cara é essa?

- Ando meio doente, mas já tô melh...

- Tá sentindo o quê?

- Ah, dor no corpo...um pouco de febre, enxaqueca...

- É dengue!

- Hmm. Eu fui no médico e ele disse que não er...

- E médico lá sabe de alguma coisa? Meu filho, isso aí é dengue, na certa. Minha tia tava assim mesmo. Cheia de dor, com febre. Acabada, igualzinha a você.

- Peraí, também não é assim! Eu não tô acab...

- Tá, meu filho, só de olhar, dá pra ver que você tá arrombado.

- Arrombado? Putamerda, que exag...

- E olhe, tem que se cuidar viu? Lembra da prima de segundo grau da minha nora? Pois o caso dela foi ainda mais grave. Teve dengue hemorrágica. Lascou-se. Quase morre e ainda ficou manca, coitada.

- Manca?! O que tem a ver com a dengue?

- Nada. Levou um baque indo pro hospital e nunca mais ficou boa. Mas veja você, se não fosse pela dengue hemorrágica, tinha ficado em casa e tava até hoje boazinha.

- Bom, eu mesmo já tô me sentindo melhor. Brigado pela preocupação, viu?

- ...e ainda teve a amiga da prima de Jurema, lá da Farmácia.

- ...

- Bichinha. Essa daí foi que levou fumo mesmo. Um dia boazinha, só uma dor de cabeça de leve, uma quentura passageira. No outro...

- No outro...?

- Tava morta! Mortinha, assim, estirada no chão. Começou que nem você, não se cuidou, lascou-se.

- Caralho, ela morreu fulminada de dengue hemorrágica?!

- Teve um AVC, coitada. Também, 87 anos no lombo não é brincadeira, né?

- ...

- E também teve o caso do...

E por aí vai. O limite é sua paciência ou a morbidez da sua curiosidade. E é por isso que eu, quando estou doente, faço de tudo para que ninguém descubra e tento cumprir minhas obrigações na maior normalidade possível. Afinal de contas, ruim não é ficar de cama por causa de alguma enfermidade.

Bem pior é ter que escutar das pessoas todas as formas pelas quais você vai, inevitavelmente, morrer.

3 comentários:

  1. kkkkkkkkk, bolei de rir aqui!
    Adorei o texto e que você fique realmente curado aí!
    :**********

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  2. Tenho que admitir, gosto de ficar doente, tipo gripe que deixa você cama por um dia. Acho que pela possibilidade de desmarcar os compromissos para os quais não quero ir, deixar de cumprir as tarefas rotineiras. Me bota na cota dos insanos.

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  3. Muito engraçado seu texto!! kkkkkk
    É notável como todo mundo tem um parente que sempre nos enrola com esse tipo de conversa...
    E melhoras pra vc :)

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Vai, danado, reclama!